Venezuelanos votam em eleições legislativas com ‘sabor’ de presidenciais

Campanha chavista com ampla referência ao falecido presidente; longas filas desde a madrugada sugerem maior importância à disputa

“Eu nunca tinha votado para a Assembleia, mas dessa vez faço questão. Não são quaisquer eleições as deste domingo”, afirma Gladys Villaruel, moradora de Ocumare. Assim como ela, milhões de venezuelanos devem comparecer às urnas neste domingo (06/12) para eleger a nova Assembleia Nacional e escolher os 167 deputados que farão parte do próximo ciclo legislativo.

Apesar de serem eleições parlamentares, a campanha do chavismo, com ampla referência ao falecido presidente e as longas filas que se registram desde as primeiras horas da manhã em todo o país, trazem um “sabor” de presidenciais ao pleito.

Marina Terra/ Opera Mundi

Venezuelanos se concentram, desde as primeiras horas da manhã, nos centros de votação

Em setembro de 2010, a última eleição legislativa, foi registrada a participação de 66.45% dos eleitores aptos a votar, enquanto das presidenciais de abril de 2013, 79.69%. É comum que as eleições para escolha do presidente reúnam mais votos, mas frente à importância dessa atual disputa, a assistência de eleitores deve ser igualmente alta.

Na Escola Experimental Venezuela, localizada na Avenida México, desde as cinco horas da manhã já havia fila. Opera Mundi conversou com eleitores que esperavam a vez para votar e alguns reclamavam da quantidade de gente. “Nunca tinha visto tantos votantes nesse horário. Sempre voto cedo em eleições, mas dessa vez me surpreendi”, conta Cesar Paez, de 70 anos. Ele prefere não revelar a preferência política, mas diz que quer uma “mudança” no país. “Essa fila enfrento com gosto. Mas as de supermercado e banco e tantas outras, já não aguento mais”, reclama.

Marina Terra/ Opera Mundi

Acostumados às filas para votar, muitos levam cadeiras para esperar de forma mais confortável

Os problemas econômicos e de violência que vêm enfrentando a Venezuela são apontados por alguns dos eleitores como decisivos para a escolha do voto. Já é cenário comum em Caracas as longas filas do lado de fora de supermercados, que podem durar até oito horas. O governo venezuelano afirma combater a falta de produtos e a ação de contrabandistas, que revendem itens de necessidade básica, como arroz, açúcar e café, mas a situação ainda está longe de se normalizar.

Freddy Chávez, após votar em Caracas| Foto: Marina Terra/ Opera MundiFreddy Chávez, após votar em Caracas| Foto: Marina Terra/ Opera Mundi

 

Além disso, a insegurança também é preocupação de muitos, principalmente daqueles que vivem em Caracas, um centro urbano bastante povoado. 47% dos venezuelanos apontam a insegurança como a questão mais importante do país, de acordo com relatório de 2014 do centro de estatísticas chileno Latinobarómetro.O temor gira ao redor tanto da criminalidade urbana, como de recentes episódios de violência por motivos políticos. Há pouco mais de um ano, o país foi afetado por uma onda de violência gerada após protestos opositores, resultando na morte de mais de 40 pessoas. Após a eleição presidencial de abril de 2013, quando Maduro derrotou o governador de Miranda, Henrique Capriles, também houve casos de violência, deixando mais de 10 mortos.

“Eu tenho consciência de que esse governo e nós, o povo, não somos perfeitos. Que há uma ameaça grande dos poderes econômicos e políticos de dentro e fora do país. Por isso continuo acreditando na revolução e votei pelo PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela)”, explica Freddy Chávez, de 35 anos. Com o dedo manchado de tinta – última etapa do processo de votação venezuelano –, ele aposta em uma vitória no GPP (Grande Polo Patriótico) nessas eleições.

 

Prédio da Missão Habitação em Caracas| Foto: Marina Terra/ Opera MundkiPrédio da Missão Habitação em Caracas| Foto: Marina Terra/ Opera Mundi

Perto dali, músicas da campanha chavista e revolucionárias soavam alto. Moradores de um edifício entregue pela Missão Habitação (Misión Vivienda), decorado com cartazes de Chávez, contam que a zona onde estamos é de maioria opositora e que por isso fazem barulho. “Não gostam que nós, os pobres, moremos aqui nessa avenida tão bonita. Mas esse apartamento quem me deu foi meu comandante e por ele votaremos hoje”, responde Norma Díaz, de 40 anos. Um rapaz passa em moto e grita: “Vão perder!”. Todo o vaiam, para depois aumentarem ainda mais o som.

Mesas e acompanhamento

Antes das nove da manhã 100% das mesas eleitorais estavam abertas, como afirmou a chanceler venezuelana, Delcy Rodríguez, a meios de comunicação após votar, na capital. Antes, a reitora principal do CNE (Conselho Nacional Eleitoral), Tibisay Lucena, assegurou que a partir das 8h todas já estavam funcionando em todo o território nacional.

O direito ao voto é facilitado pelo chamado “Plano República” da FANB (Força Armada Nacional Bolivariana), que é ativado às vésperas de qualquer eleição na Venezuela, e que nesta ocasião mobilizou por todo o país 163 mil soldados, além de outros 25 mil da reserva.

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Pinturas em muros lembram presidente recém-eleito na Argentina Maurício Macri em contraste com legado de Chávez

A missão de acompanhamento eleitoral da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) também está ativa desde o começo da manhã e começou a acompanhar as mesas de votação pelo oeste de Caracas.

A delegação terá a tarefa de apresentar 13 relatórios sobre as eleições. Uma resenha preliminar será entregue ao CNE nesta segunda-feira (07/12), com um balanço qualitativo das eleições. Também, em 15 dias, a Unasul apresentará um informe definitivo do processo eleitoral.

Publicado por milton alves

Milton Alves, 59 anos, residente em Curitiba. Ativista político e social. Jornalista e escritor. Colabora em diversas mídias progressistas e de esquerda. É autor dos livros 'A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT' (2019), 'A Saída e pela Esquerda' (2020), 'LAVA JATO, uma conspiração contra o Brasil' (2021) e de 'Brasil Sem Máscara- o governo Bolsonaro e a destruição do país - todos pela kotter Editorial. Também atuou por muitos anos na imprensa sindical. Graduado em Gestão Pública pela UFPR e estudou na Instituição Julio Antonio Mella (Havana-Cuba).

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